A 3ª edição da Jornada Literária do Distrito Federal começou oficialmente nesta 3ª feira, 14, com o Teatro Sesc Newton Rossi, em Ceilândia, praticamente lotado de crianças e adolescentes, alunos e professores das escolas públicas e creches. Neste primeiro dia do evento, realizado com verba do Fundo de Apoio à Cultura, FAC-DF, e cor-realizado pelo Sesc DF, a meninada pode ver, ouvir e conversar com oito autores, entre contistas, poetas e escritores infantis, ilustradores e quadrinistas.
Um dos convidados foi o gaúcho radicado em Brasília Jeferson Assumção. Ele conversou com a plateia sobre um de seus livros, Cabeça de Mulher Olhando a Neve, cujos contos têm um traço comum: em todas as histórias neva no Brasil inteiro. Segundo o autor, a conversa fluiu porque os alunos haviam lido o livro e trabalhado as histórias em sala de aula; e isso possibilitou perguntas de qualidade. “Me perguntaram para que serve a literatura, qual a relação entre ela e a vida. Perguntaram sobre a linguagem que usei, sobre o que há de biográfico na obra”, conta Jeferson, bem impressionado com a participação do público.
Outro que elogiou a iniciativa da Jornada em promover a leitura prévia das obras dos autores convidados foi Tino Freitas. Ele esteva na abertura do evento e conversou sobre uma de suas obras mais conhecidas: Cadê o juízo do menino? “Dessa forma, eu venho em um evento igual a este não apenas para falar de mim para o outro, mas eu também vou saber a impressão que o outro teve de mim, ou do que meu livro conseguiu passar para eles. E isso é um grande presente”, explicou Tino, satisfeito com o resultado.
Por sua vez, Noélia Ribeiro teve o cuidado de separar poemas seus que considera de fácil entendimento, afinal, iria se apresentar em uma roda de poesia para alunos de no máximo 14 anos, público mais novo do que está acostumada a autora da trilogia Espevitada, Escalafobética e Atarantada. Só que a gurizada surpreendeu a poeta. “Nem precisava ter escolhido. Elas têm uma percepção enorme de tudo. Crianças curiosas, atentas. Cada poema que eu terminava provocava uma expressão de espanto, de emoção”, contou Noélia, entusiasmada com o resultado. “Eles ficaram impressionados quando eu disse que conheci o Renato Russo. Um menino falou sobre Patativa do Assaré e Ariano Suassuna”, acrescenta a autora, surpresa com o conhecimento da garotada.
Ela atestou o envolvimento dos alunos com seu gênero literário. “Uma aluna, que escreve poesia, me perguntou o que deve fazer quando não consegue terminar um poema. Me perguntou se deveria jogar fora. Eu disse não, deixa lá, que um dia você termina”, contou Noélia, para ilustrar sua apresentação. “Me despedi dizendo ‘se quiserem que eu volte, é só falar’ ”.
Para Jeferson Assumção, esse envolvimento dos alunos com a leitura e o livro é proporcionado pela própria concepção da Jornada Literária e o que ela oferece. “Se você faz uma festa em torno do livro, é óbvio que haverá uma valoração social por parte dos jovens. Isso tem a ver com a qualidade do evento, de fazer a coisa de modo natural, em lugar bacana, confortável, com programação de qualidade. Isso conquista a adesão dos jovens, eles vêm super interessados, com perguntas inteligentes. Esses eventos colocam o livro num lugar de destaque no imaginário coletivo”, acredita o autor.
Essa identificação dos alunos com a literatura e com o que encontram nos livros ficou bem clara nas apresentações de Meimei Bastos e Cristiane Sobral, duas poetas e atrizes que militam na literatura em favor da igualdade de gênero e contra o racismo. Nas duas apresentações, o público riu, cantou, dançou e aplaudiu de pé o que viu no palco do Teatro Sesc Newton Rossi.
Cristiane Sobral usou o cabelo como exemplo de afirmação das meninas negras. “Essa questão do cabelo toca muito forte nessa faixa etária deles, na adolescência, porque eles são muito atingidos pela mídia e nas escolas essa questão imagética é muito forte. Porque as meninas o tempo inteiro são atingidas pelas revistas, novelas, as mães veem muitas novelas e as adolescentes são muito pautadas pela opinião do grupo, a não aceitação do grupo.”, explica Sobral.
Para ela, a literatura é uma forma de as pessoas se aceitarem do jeito que são. “Então surge uma demanda dessas camadas populares por leitura, de querer ver suas histórias representadas. É a literatura como aceitação da identidade. Eles demoraram muito tempo para ver essa literatura que os representa e agora querem com muita voracidade”, completa Sobral, acrescentando que as mães a procuram no facebook para comprar seus livros, pois ela descreve uma situação que os filhos dessas mulheres estão vivendo.
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